A nossa cultura transformou orgulho em virtude. Somos encorajados o tempo inteiro a “amar a nós mesmos”, potencializar, enaltecer nossas qualidades. Mas... o que será que a Bíblia diz a respeito?
Desde as suas primeiras páginas, as Escrituras confrontam o orgulho. “Você será como Deus”. Essa foi a proposta da serpente a Adão, no jardim do Éden (Gn 3.5). Aqui está o fundamento do orgulho. Trata-se da proposta de ser o que não somos e nos colocarmos como Deus.
O povo de Israel foi advertido contra o orgulho. Em Lv. 26.19, lemos:
“Porque quebrarei a soberba da vossa força; e farei que os vossos céus sejam como ferro e a vossa terra como cobre”.
O contexto dessa advertência era a orientação de Deus para que o povo andasse de acordo com Sua Palavra. Do v. 4 ao v. 13, Moisés fala das bênçãos decorrentes da obediência.
A partir do v. 14 e 15 ve-se uma advertência:
“14 Mas, se não me ouvirdes, e não cumprirdes todos estes mandamentos. 15 E se rejeitardes os meus estatutos, e a vossa alma se enfadar dos meus juízos, não cumprindo todos os meus mandamentos, para invalidar a minha aliança”.
O v. 16 e 17 fala do que aconteceria em decorrência disso. Em seguida, a punição é ampliada:
“18 E, se ainda com estas coisas não me ouvirdes, então eu prosseguirei a castigar-vos sete vezes mais, por causa dos vossos pecados. 19 Porque quebrarei a soberba da vossa força; e farei que os vossos céus sejam como ferro e a vossa terra como cobre.”
A força a qual o texto se refere é a força do trabalho para gerar mantimento. Essa força foi dada graciosamente por Deus para que o homem desenvolvesse a missão que Ele o tinha dado: cultivar e guardar (Gn 2.15). Entretanto, com o pecado ela passou a ser fonte de soberba. O homem passou a pensar em sua existência autônoma em relação a Deus.
Perceba então a relação entre os conceitos aqui:
1- Mandamento de Deus
2- Quebra
3- Maldição
4- A soberba como fonte dessa quebra. Como pensamento de que é possível uma existência autônoma em relação a Deus.
Isso nos remete a Gn 3. A tentação e queda também envolveu esses conceitos. Veja:
1- O mandamento:
“E ordenou o SENHOR Deus ao homem, dizendo: De toda a árvore do jardim comerás livremente, Mas da árvore do conhecimento do bem e do mal, dela não comerás; porque no dia em que dela comeres, certamente morrerás.” (Gn 2.16,17)
2- A Quebra do mandamento – 3.6
3- A maldição – 3.17
4- A soberba como fonte da queda – 3.6
“Vendo a mulher que a árvore era:
a- boa para se comer,
b- agradável aos olhos,
c- desejável para dar entendimento”
João (1 Jo 2.16) diz que esses 3 elementos são:
a- a concupiscência da carne, (boa para se comer)
b- a concupiscência dos olhos e (agradável aos olhos)
c- a soberba da vida, (desejável para dar entendimento)
“A soberba da vida” refere-se a Gn 3.5:
“Porque Deus sabe que no dia em que dele comerdes se abrirão os vossos olhos, e sereis como Deus, sabendo o bem e o mal.”
Ou seja, a soberba implica em rejeição ao conhecimento de Deus em favor de um conhecimento próprio, autônomo em relação a Deus.
Essa é a característica do “ímpio”, na literatura sapiencial. Ele rejeita a Deus e à sua Palavra.
Em provérbios, a sabedoria está em seguir o caminho do Senhor, ou seja, a Sua Palavra.
Por outro lado, o soberbo segue o seu próprio caminho:
“Os retos fazem o seu caminho desviar-se do mal; o que guarda o seu caminho preserva a sua alma. A soberba precede a ruína, e a altivez do espírito precede a queda. Melhor é ser humilde de espírito com os mansos, do que repartir o despojo com os soberbos. O que atenta prudentemente para o assunto achará o bem, e o que confia no SENHOR será bem-aventurado.” (Pv 16.17-20).
E sabe o que é pior do orgulho? Ele nos cega. Ele nos domina de tal maneira que nos faz cegos para sequer enxergar a realidade. Diante disso, C.S.Lewis, em Cristianismo puro e simples nos ajuda com algumas perguntas:
1- Quanto me desagrada quando alguém me despreza?
2- Quão irado fico quando alguém me dá uma bronca?
3- Qual é a minha reação quando alguém se exibe com ostentação?
4- Como reajo quando alguém recebe um elogio que dizia respeito a mim?
5- Costumo comparar os outros em relação aos meus estudos, trabalho, embelezamento, posses?
6- Me sinto mais espiritual do que a maioria das pessoas?
7- Quão ofensiva é para mim a doutrina da Graça?
Percebe o quanto somos orgulhosos, sem que nos demos conta disso? Nos sentimos melhores! Temos melhores ideias, melhores recursos e estratégias. Nosso orgulho se expressa quando não buscamos a vontade de Deus nas Escrituras (quanto a com quem nos casaremos, por exemplo). Nosso orgulho se expressa quando desprezamos o conselho dos mais velhos. Nosso orgulho se expressa quando somos exortados pelos líderes da igreja e não nos submetemos.
Entretanto, Jesus rejeitou a proposta da serpente (“será como Deus”) e inverteu totalmente a ordem vista na queda e em toda a história humana. Em Fl 2 está escrito:
“De sorte que haja em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus, que, sendo em forma de Deus, não teve por usurpação ser igual a Deus, (veja a alusão a Gn 3). Mas fez a si mesmo de nenhuma reputação, tomando a forma de servo, fazendo-se semelhante aos homens; E, achado na forma de homem, humilhou-se a si mesmo, sendo obediente até à morte, e morte de cruz. (Fl 2.5-8).
Ao inverter essa ordem, Jesus criou para si um povo à Sua imagem e semelhança. Seus discípulos são moldados a cada dia, com a operação do Espírito Santo, à imagem de dEle.
Queridos, a caminhada cristã é um caminho de humildade, em que nos curvamos à vontade de Deus, conforme revelada nas Escrituras. Agora, uma vez sendo filhos de Deus pelo sacrifício de Cristo, somos exortados a ser humildes, tendo paciência e suportando uns aos outros (Ef 4.2); somos encorajados a abrir mão de nossa vontade em prol da vontade de Deus (Ef 5.10); somos admoestados a nos sujeitar uns aos outros (Ef 5.21); os jovens, são orientados a se submeter aos mais velhos, uma vez que Deus resiste aos soberbos (1 Pe 5.5).
pr. Nelson Galvão
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